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Os combustíveis de baixo carbono e a transição energética – um papel no futuro. 

Opinião de Luís Gil, Conselheiro e Especialista em Energia pela Ordem dos Engenheiros

Para quem esteja atento às questões da transição energética, nomeadamente no que se refere à mobilidade, poderá parecer inevitável que os combustíveis líquidos de baixo carbono (LCLF, da sigla em inglês) venham a ter, num futuro próximo, um papel muito importante na descarbonização do setor dos transportes, embora haja ainda muito por fazer.

A descarbonização deste setor só pode ser feita através da promoção de uma transformação progressiva, de forma a garantir uma descarbonização sustentável que assenta nos pilares da segurança do setor energético e da sustentabilidade ambiental.

Neste domínio, é de referir a recentemente criada PCBC (Plataforma de Combustíveis de Baixo Teor de Carbono) atualmente constituída por onze entidades e que tem como principal objetivo alertar os diferentes atores, dos decisores políticos ao consumidor final, para que encontrem meios complementares e alternativos para contribuir para uma fase de transição energética assente numa descarbonização sustentável, baseada numa diversidade de vetores energéticos e de soluções tecnológicas.

Segundo a PCBC, em Portugal no final de 2021, os veículos com combustíveis a gasóleo e a gasolina representavam 97,5% do parque automóvel, deixando apenas 2,5% do parque circulante para veículos híbridos, a gás ou elétricos. No último ano houve, no entanto, um crescimento desta segunda fração do transporte rodoviário. Segundo a UVE (Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos) foi mesmo atingido um novo recorde mensal nas vendas dos Veículos 100% Elétricos (BEV) novos neste início de ano, tendo-se vendido em janeiro de 2023 2509 veículos BEV, um crescimento de 3,8% relativamente a dezembro de 2022 e um fantástico crescimento homólogo de 120,5%.

Muitos especialistas duvidam que os veículos elétricos sejam a única solução para a atingir a ambicionada neutralidade carbónica, defendendo um caminho composto por diferentes soluções tecnológicas. Assim sendo, como pretende a UE aumentar o uso dos combustíveis “descarbonizados” sustentáveis?

A dependência excessiva dos combustíveis fosseis, não se pode repetir, mas, substituí-los por uma solução elétrica em exclusivo, é incorrer num erro semelhante, se nos lembrarmos, por exemplo, da dependência das matérias-primas críticas associadas.

Por isso a aposta na substituição dos combustíveis fósseis por combustíveis sustentáveis de origem não petrolífera, que podem ser utilizados nos ativos atuais, evitando disrupções e tornando-os mais acessíveis em termos de custos globais, parece ser a solução óbvia. Porém, isso depende da vontade política dos governos.

Relativamente à mobilidade elétrica, a utilização destes combustíveis irá diminuir o custo de desenvolvimento do sistema de distribuição/carregamento elétrico e reduzir a pressão temporal que a total substituição de frotas implica. Os combustíveis líquidos com baixo teor de carbono, à medida que entrarem no mercado, permitirão descarbonizar progressivamente toda a frota rodoviária em circulação, tanto dos veículos já existentes como dos novos, ao passo que os veículos elétricos a bateria ou a pilha de combustível a hidrogénio exigirão, em vez disso, uma substituição progressiva da frota automóvel.

Um estudo encomendado pela FuelsEurope mostra que nos países ocidentais da UE, apenas 40%-60% da população tem capacidade para comprar um carro novo, enquanto que nos países da UE Central e Oriental, menos de 20% da população tem. Ou seja, o mercado de veículos em 2ª mão tem assinalável importância.

Mais uma razão para o uso destes combustíveis se queremos uma descarbonização rápida e com fácil aceitação, assegurando que o transporte com baixo teor de carbono seja acessível a todos.

Concluindo, os combustíveis de baixo carbono são um dos vetores energéticos essenciais para a descarbonização da mobilidade. Os cidadãos exigem mais opções na transição para a mobilidade climaticamente neutra, e os Combustíveis Líquidos de Baixo Carbono, conjuntamente com a eletrificação e o hidrogénio, serão parte da solução.

O PRR e as ferramentas financeiras que traz, poderá servir de apoio à implementação de instalações de produção destes combustíveis consolidando o desenvolvimento industrial e o emprego em tecnologias inovadoras para a descarbonização, em apoio à ambição climática, mas também em termos das necessidades sociais e económicas dos consumidores.

Para isso será necessário proceder à elaboração de um quadro legislativo que valorize e apoie todas as tecnologias de baixo carbono em benefício das economias e dos consumidores, assim como o desenvolvimento de casos de negócios para os investimentos em combustíveis de baixo carbono.

Só desta forma será possível atingir o propósito de contribuir para que os transportes marítimo, aéreo e rodoviário se tornem aceitavelmente “descarbonizados”.

 

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